O FÓRUM NACIONAL DE COMBATE AOS IMPACTOS DOS AGROTÓXICOS, instrumento de controle social que congrega entidades da sociedade civil com atuação em âmbito nacional, órgãos de governo, o Ministério Público e representantes do setor acadêmico e científico, por seus representantes abaixo assinados, vem a público REPUDIAR os termos do Projeto de Lei nº 3.200/2015, de autoria do Deputado Federal Covatti Filho, que pretende revogar as Leis nº 7.802/1989 e nº 9.974/2000 e os termos do Projeto de Lei 6299/2015, de autoria do Senador Blairo Maggi, dispõe que o registro prévio do agrotóxico será o do princípio ativo; dá competência à União para legislar sobre destruição de embalagem do defensivo agrícola. Os PLs alteraram profundamente a Política Nacional de Agrotóxicos, com direta violação aos princípios da prevenção, da precaução, da vedação de retrocesso e consequente precarização da defesa do meio ambiente, da segurança alimentar e da saúde humana, pelos seguintes motivos:

CONSIDERANDO que os PLs invertem completamente a lógica da proteção ao meio ambiente e da saúde, consubstanciada, inicialmente, na retirada da nomenclatura de “agrotóxico”, adotando o termo “produtos defensivos fitossanitários”, mascarando, desta forma, as características tóxicas e nocivas desses produtos;

CONSIDERANDO que a substituição da palavra “agrotóxico” por um termo mais brando e pretensamente técnico, apesar de parecer inofensiva, é capaz de propagar a errônea ideia de uma substância voltada para a proteção dos vegetais, sem considerar seu caráter tóxico e perigoso ao meio ambiente e ao ser humano, causando confusão com os produtos utilizados na cultura orgânica, que já são atualmente intitulados “produtos fitossanitários com uso aprovado para a cultura orgânica”. Além disso, a adoção do conceito de “defensivo fitossanitário” abre espaço para a desnecessidade de registro de herbicidas como o 2,4D, paraquate e glifosato;

CONSIDERANDO que a alteração pretendida está na contramão dos países que detêm a legislação mais avançada no assunto, como aqueles pertencentes à União Europeia, os quais utilizam o termo “pesticides” (pesticidas), que ao menos possui a conotação de “veneno”;

CONSIDERANDO que a mudança contida nos PLs implica também na exclusão, do seu campo de incidência, dos agrotóxicos destinados a ambientes urbanos e industriais, os quais passarão a ser regulados unicamente pela Lei n.º 6.360/76 (Vigilância Sanitária), concentrando responsabilidades somente no Ministério da Saúde;

CONSIDERANDO que, no que se refere às proibições, em uma demonstração de inexplicável tolerância com substâncias altamente nocivas à saúde e meio ambiente, os PLs abrem espaço para a utilização de produtos atualmente proibidos pela legislação em vigor, mediante a introdução do aberto e perigoso conceito de “risco inaceitável”;

CONSIDERANDO que, de acordo com a proposta, somente serão proibidas substâncias: “a) para os quais o Brasil não disponha de métodos para desativação de seus componentes, de modo a impedir que os seus resíduos remanescentes provoquem riscos inaceitáveis ao meio ambiente e à saúde pública; b) para os quais não haja antídoto ou tratamento eficaz no Brasil; de acordo com os conhecimentos técnicos e científicos atuais; c) que revelem um risco inaceitável para características teratogênicas, carcinogênicas ou mutagênicas, de acordo com os resultados atualizados de experiências da comunidade científica; d) que revelem um risco inaceitável para distúrbios hormonais, danos ao aparelho reprodutor, de acordo com procedimentos e experiências atualizadas na comunidade científica; e) que revelem um risco inaceitável mais perigoso para o homem do que os testes de laboratório, realizados com animais ou através de métodos alternativos, tenham podido demonstrar, segundo critérios técnicos e científicos atualizados; f) cujas características revelem um risco inaceitável para saúde humana, meio ambiente e agricultura, segundo critérios técnicos e científicos atualizados”, ou seja, ficará ao critério do Órgão Registrante definir se um risco é aceitável ou não.

CONSIDERANDO que, em relação ao procedimento de registro, outra mudança contestável no PL 3.200/2015 é a previsão de criação da Comissão Técnica Nacional de Fitossanitários (CTNFito), atribuindo-lhe competência para emitir pareceres técnicos conclusivos e vinculativos sobre os pedidos de avaliação de agrotóxicos. No âmbito da referida Comissão, as decisões serão tomadas pela maioria absoluta dos membros, cabendo ao seu Presidente o voto de desempate. Além disso, todos os integrantes da CTNFito, inclusive seu Presidente, serão designados, escolhidos ou nomeados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA);

CONSIDERANDO, ainda, que no modelo proposto identifica-se uma concentração injustificada de poderes no MAPA, em detrimento dos Ministérios do Meio Ambiente (MMA) e Saúde (MS), cuja implementação resultará na quebra da paridade e igualdade na confrontação entre os diversos direitos e interesses envolvidos;

CONSIDERANDO que, caso a malfadada legislação proposta seja aprovada, todos os demais personagens participantes do processo terão sua atuação pautada pelos limites delineados nos vinculativos pareceres exarados pela CTNFito, restando expressamente proibida a formulação de exigências técnicas adicionais que extrapolem as condições anteriormente estabelecidas pela Comissão, nos aspectos relacionados à segurança e à eficiência. Tal previsão representa flagrante violação aos princípios da precaução e vedação ao retrocesso;

CONSIDERANDO, finalmente, que os Projetos de Lei impõem limitação aos entes federativos – Estados, DF e Municípios – no que se refere à sua autonomia para restringir o alcance do registro federal, admitindo-a somente nas hipóteses de particularidades regionais devidamente justificadas. Ou seja, os entes foram cerceados, de maneira absolutamente desarrazoada, em sua autonomia para legislar de forma mais favorável ao meio ambiente e à saúde humana, restando-lhes somente o diminuto espaço das supostas “peculiaridades regionais fundamentadas”,

ENTENDE o FÓRUM ser indispensável a adoção de uma postura comprometida com o meio ambiente e a vida, bem como responsável e restritiva quanto aos agrotóxicos no país, o que não se coaduna com as propostas constantes dos PLs, inclusive porque não levará em consideração o custo gerado pelas doenças decorrentes do uso de agrotóxicos, causadas até mesmo na exposição a essas substâncias em baixas dosagens, mas de modo repetitivo.

POR OUTRO LADO, sendo o Brasil o maior consumidor mundial de agrotóxicos, o FÓRUM vê como indispensável estimular alterações legislativas capazes de reverter esse quadro e não flexibilizar a legislação, pois resultará no aumento do consumo dessas substâncias com graves e irremediáveis problemas de saúde pública e ambientais.

DIANTE DO EXPOSTO, o Fórum Nacional de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos vem tornar público seu REPÚDIO AO PL Nº 3.200/2015 e ao PL N° 6.299/2015, pelo que eles representam em termos de agravamento de riscos e de retrocesso nos termos acima.