O FÓRUM NACIONAL DE COMBATE AOS IMPACTOS DOS AGROTÓXICOS e os FÓRUNS ESTADUAIS abaixo nominados, instrumentos de controle social que congregam entidades da sociedade civil com atuação em âmbitos estadual, regional e nacional, órgãos de governo, o Ministério Público e representantes de setores acadêmicos e científicos, por seus representantes abaixo-assinados, conforme deliberação unânime da Plenária Anual, ocorrida nos dias 4 e 5 de novembro de 2019, no âmbito do XI Congresso Brasileiro de Agroecologia – CBA, no Campus da Universidade Federal de Sergipe, vêm a público manifestar seu REPÚDIO a quaisquer formas de intimidação e repressão a trabalhos acadêmicos e científicos que demonstram relação de causalidade entre agrotóxicos e problemas graves de saúde aos seres humanos, em especial o realizado pela imunologista Mônica Lopes-Ferreira, pós-doutora na área de Bioquímica e Farmacologia, Pesquisadora Científica Nível VI e Diretora do Laboratório Especial de Toxinologia Aplicada (LETA) do Instituto Butantan , considerando que:

1. segundo notícia divulgada pelo Jornal O Estado de São Paulo em 4/8/2019 , foram analisados, entre os dez principais agrotóxicos utilizados no Brasil, dez deles, abamectina, acefato, alfacipermetrina, bendiocarb, carbofurano, diazinon, etofenprox, glifosato, malathion e piripoxifem, utilizando-se concentrações progressivas a partir de um trigésimo do recomendado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), concluindo que não existe dosagem mínima de exposição totalmente segura;

2. ainda conforme O Estado de São Paulo, foi utilizada a Plataforma Zebrafish, cuja metodologia é considerada de referência mundial para testar toxinas presentes na água, com os peixes-zebra (Danio rerio), os quais possuem 70% de similaridade genética aos seres humanos;

3. os ingredientes glifosato, melathion e piriproxifem causaram a morte de todos os embriões de peixes em 24h de exposição, independente da concentração, e os demais causaram morte ou problemas de malformação ou neuromotores, em maior ou menor porcentagem;

4. em razão da referida notícia, houve a instauração de procedimento administrativo sob o argumento de verificar a origem da encomenda e a possível ausência de conhecimento pelo Instituto Butantan, conforme Portaria IB, de 5-8-2019, publicada no diário oficial do Estado de São Paulo de 27 de agosto de 2019 ;

5. a pesquisadora foi suspensa por seis meses pela Comissão de Ética no Uso de Animais do Instituto Butantan (CEUAIB), sem oportunidade de defesa, como reconhecido em sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública, do Foro Central da Comarca de São Paulo, no Mandado de Segurança nº 1050715-06.2019.8.26.0053 , que também declarou que essa decisão violou o princípio republicano “por suspender de atividade uma pesquisadora que trouxe a público informação de inegável interesse da sociedade dos fortes indícios de graves impactos ao meio ambiente e à saúde da população causados pelo uso de agrotóxicos”;

6. a Constituição Federal resguarda o direito à produção acadêmica e científica, inclusive determinando ao Estado que promova o seu incentivo (artigos 5º, incisos IV e IX ; 200 e 218, caput );

7. o direito à informação , à saúde e à alimentação adequada , e à proteção dos consumidores também possuem assento constitucional, sendo que as ações e os serviços de saúde foram expressamente classificados pelo Texto Maior como prestações de relevância pública ;

8. o direito à informação abrange a liberdade de informar, de se informar e de ser informado, devendo-se ter em mente que a todo cidadão deve ser garantida a possibilidade de receber livremente dados sobre assuntos de interesse da coletividade, assegurando-se, por conseguinte, o direito de saber e de aprender sobre temas relacionados às suas legítimas cogitações , com muito mais razão quando interferem diretamente em sua qualidade de vida e bem-estar, como é a questão dos agrotóxicos, de seus impactos na saúde do trabalhador e da população geral, de seus resíduos nos alimentos e na água e de suas implicações no meio ambiente;

9. o uso de agrotóxicos no Brasil, recordista em consumo por área de plantação , é uma questão de saúde pública, ambiental e de Direitos Humanos, como bem já se manifestou a Organização das Nações Unidas, em múltiplas publicações , de maneira a demandar ampla difusão de informações sobre o tema à população;

10. diversos agrotóxicos já banidos pela União Europeia, devido ao seu comprovado potencial de perigo à saúde seguem em uso no Brasil, culminando num círculo vicioso em

meio ao qual agronegócio e empresas agroquímicas são codependentes, adotando modelo de mercado baseado no uso intensivo de agrotóxicos, impulsionado em detrimento da segurança e da saúde humana, animal e ambiental;

11. o conhecimento humano é dinâmico, de modo que os avanços tecnológicos e científicos, como os apresentados pela pesquisadora Mônica Lopes-Ferreira, abrem caminho para que a produção acadêmica supere entendimentos anteriores mediante a realização de competentes estudos;

12. nesse sentido, a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer da Organização Mundial da Saúde (IARC/WHO), em 2015, classificou o glifosato, agrotóxico que corresponde a 40% do total utilizado no Brasil, como provável cancerígeno (grupo 2A), após avaliação de extensa literatura científica por especialistas;

13. da mesma forma, em recente julgado norte-americano, considerou-se carcinogênico o produto RangerPro, a base de glifosato, condenando a fabricante Monsanto ao pagamento de R$ 1,1 bilhão a um trabalhador que desenvolveu linfoma não-Hodgkin, após exposição prolongada ao herbicida ;

14. o progresso dos saberes científicos é indispensável à efetiva aplicação da Resolução nº 221/2018 , da Diretoria Colegiada da ANVISA – e mesmo à sua utilidade –, sobretudo para que se evite a manutenção do registro de substâncias que impliquem riscos à saúde humana ou ao meio ambiente, por revelarem características teratogênicas, carcinogênicas ou mutagênicas , e

15. é primordial, diante da necessidade de diversidade e da pluralidade de ideias, a existência de trabalhos científicos que utilizem pressupostos, metodologias e conceitos diferentes que, além do propósito puro de consistir em instrumento de informação, se prestem como ferramenta de defesa dos preceitos basilares do direito constitucional, cuja observação é indispensável a uma sadia qualidade de vida.

 

Por tais motivos, os FÓRUNS REPUDIAM todas as tentativas de repressão e intimidação da produção acadêmica técnica, em especial a da imunologista Mônica Lopes-Ferreira, que reafirma a periculosidade dos agrotóxicos e constitui fundamento idôneo para se desestimular, ou até mesmo proibir, seu uso, tratando-se de imprescindível ferramenta de defesa dos preceitos basilares do direito constitucional, mormente a proteção dos trabalhadores e consumidores.

 

Brasília, 06 de dezembro de 2019.

 

Pedro Luiz Gonçalves Serafim da Silva

Coordenador Geral

 

Fátima Aparecida Borghi

Coordenadora Adjunta

 

Luiz Cláudio Meirelles

Sec. Executivo Geral

 

Fóruns Estaduais:

(Original irá assinado)